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Simplex Urbanístico: UM BALANÇO!

 

No pretérito dia 8 de Janeiro, foi publicado o Decreto-Lei n.º 10/2024 – o Simplex Urbanístico – que procedeu à reforma e simplificação dos licenciamentos no âmbito do urbanismo, ordenamento do território e indústria. As alterações mais significativas introduzidas pelo novo quadro normativo entraram em vigor no dia 4 de março. Algumas regras iniciaram a sua vigência a 1 de janeiro, sendo que outras entrarão em vigor, sucessivamente, até 2030. 

O Simplex Urbanístico representa uma mudança face ao paradigma anterior, materializando alterações em diversos diplomas, com destaque para o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (“RJUE”). Desde logo, o legislador reduz os poderes da Administração Local no controlo das operações urbanísticas, direcionando a atividade municipal para a fiscalização sucessiva e, consequentemente, obrigando a uma maior responsabilização dos particulares e técnicos projetistas no cumprimento das normas aplicáveis. 

No que concerne às fases de saneamento e apreciação liminar, os procedimentos apenas se poderão suspender se o particular demorar mais de 10 dias úteis a responder à notificação da Administração com vista ao aperfeiçoamento do pedido, sendo que, se a Administração não apresentar o convite para esse aperfeiçoamento, o direito de solicitar quaisquer correções ou informações adicionais precludirá em 15 dias úteis.

Como novidades, podemos ainda destacar que são alargados os casos de mera comunicação prévia, onde a responsabilidade dos particulares e técnicos é total,  sempre que a operação urbanística se encontre abrangida por planos de pormenor posteriores, unidades de execução com determinadas caraterísticas ou loteamentos. O mesmo, mutatis mutandis, quanto a obras de urbanização, remodelação de terrenos, obras de construção, de alteração ou de ampliação, se se localizarem em enquadramento urbanístico similar.

Simultaneamente, várias operações ficam isentas de controlo prévio. Destacamos, as obras de reconstrução e de ampliação das quais não resulte um aumento da altura da fachada, mesmo que impliquem o aumento do número de pisos (com impacte estrutural), o aumento da área útil das edificações e operações urbanísticas que tenham sido objeto de Pedido de Informação Prévia (“PIP”) favorável. 

Sobre os PIP, observa-se a sua crescente importância como, de facto, um “novo” procedimento. Perante um PIP favorável, agora válidos por 2 anos, e ao abrigo dos n.os 2 e 3 do artigo 14.º do RJUE, o particular obterá da Administração um ato administrativo vinculativo da sua posição. 

Sob a égide da simplificação e modernização administrativa, o Simplex Urbanístico promove a redução dos prazos de decisão e simplificação da tramitação procedimental. Os prazos para decisão dos pedidos de licenciamento, passam a ser contados da data da submissão do pedido, e são alargados apenas para permitirem, no silêncio da Administração, um deferimento tácito. Assim, ainda que a Administração não se pronuncie no prazo de decisão legalmente previsto, após o seu decurso, a pretensão considerar-se-á tacitamente deferida. Se o silêncio da Administração compreender uma decisão final sobre pedido de licenciamento, a formação do deferimento tácito passará a consubstanciar a licença para a realização das obras. Destarte, o prazo para a conclusão das obras sujeitas a uma licença tacitamente constituída será aquele que for proposto pelo requerente e começará a contar da data do pagamento das taxas. Não obstante, não se olvide que o instituto do deferimento tácito, pode promover, em última instância, a ausência de verificação e ponderação dos projetos urbanísticos, o que pode contender com a prossecução do interesse público. 

De igual forma, procura-se no Simplex Urbanístico a uniformização dos procedimentos a nível nacional, consubstanciada na limitação do poder regulamentar dos municípios (maxime impedindo a criação de normas de natureza procedimental ou instrutório). Os municípios terão, assim, de se adaptar, aprovando regulamentos compatíveis com o Simplex Urbanístico, sob pena de nulidade.

Por fim, de entre as restantes alterações introduzidas pelo Simplex Urbanístico, o legislador procedeu à eliminação do procedimento de autorização de utilização e do correspondente alvará. Hoje, a utilização de um edifício estará apenas dependente da entrega da documentação legalmente exigida ou da apresentação de uma comunicação prévia com prazo (no caso de alterações a usos existentes e licenciados sem obras sujeitas a controlo prévio). No seguimento da desgraduação da importância da autorização de utilização passou também a ser admissível que os atos notariais de transmissão de prédios urbanos sejam realizados sem a apresentação de um título urbanístico, aumentando os riscos dos compradores.

No âmbito do ordenamento do território, são criadas condições para o fomento de habitação por via dos planos urbanísticos através, a título de exemplo, da instituição de um procedimento simplificado de reclassificação dos solos rústicos para urbanos, tendo em vista uma maior disponibilidade de áreas destinadas ao uso habitacional. 

O novo quadro normativo representa um desafio para os intervenientes nas operações urbanísticas, pois que, indubitavelmente, a execução do Simplex Urbanístico não se afigurará simples para projetistas e promotores, pois a pedra de toque das alterações aqui analisadas compreende para estes uma maior responsabilização. Do lado dos Municípios, a adaptação também se afigura complexa em virtude dos curtos prazos para o necessário ajuste dos regulamentos municipais, bem como devida à necessidade de “contrariar” a prática enraizada de um controlo prévio “intenso” e da necessidade urgente de dotar as estruturas dos meios adequados à concretização dos objetivos simplificadores definidos pelo legislador.

 

Manuel Alexandre Henriques

Sara Teixeira Pinto

(Advogados)

 

O Conselho Regional de Lisboa tem estado atento às propostas e desenvolvimentos do Simplex Urbanístico. Relembramos as ações de formação e os podcasts dedicados ao tema, que podem ser vistos (ou revistos) aqui.