As últimas alterações ao estágio de Advocacia em Portugal têm levantado preocupações significativas entre os jovens aspirantes a Advogados.
Embora a intenção inicial das reformas fosse democratizar o acesso à profissão, a realidade tem-se mostrado bastante diferente.
Estas mudanças, em vez de facilitarem o ingresso na Advocacia, têm, na prática, dificultado o acesso de muitos jovens à profissão.
A obrigatoriedade de remuneração dos Advogados-Estagiários surgiu com o objetivo de impedir que a falta de recursos financeiros se tornasse uma barreira para aqueles com menos posses.
A ideia era nobre: assegurar que todos, independentemente da sua condição económica, pudessem realizar o estágio e, assim, seguir uma carreira na Advocacia.
No entanto, a implementação desta medida tem-se revelado problemática.
Uma das principais dificuldades é que a maior parte da Advocacia em Portugal, mais de 80%, é exercida em prática individual.
Muitos destes Advogados, que trabalham por conta própria, não têm condições financeiras para suportar os encargos de remunerar estagiários nos termos previstos pela lei – uma remuneração mínima mensal acrescida de 25%.
Além disso, é preciso reconhecer a complexidade de convencer os Advogados a pagar para ensinar, especialmente numa fase inicial do estágio.
O estágio é uma etapa fundamental para a formação prática dos futuros Advogados, mas implica um investimento significativo de tempo e recursos por parte dos patronos.
A imposição de uma remuneração obrigatória, sem considerar a realidade financeira de muitos Advogados em prática individual, agrava ainda mais a situação.
A Ordem dos Advogados, por sua vez, tem a responsabilidade de nomear um patrono para os estagiários que não consigam encontrar um.
Contudo, surge a questão: como nomear um patrono que, além de assumir a responsabilidade de formar um estagiário, ainda tenha que remunerá-lo?
Este dilema coloca em evidência a desconexão entre a medida de remuneração obrigatória e a realidade prática da Advocacia em Portugal.
No entanto, é essencial que não se ignore a realidade existente.
A medida, tal como foi implementada, não só dificulta o acesso à profissão como pode levar à elitização da Advocacia.
Com as novas exigências, o estágio pode acabar por estar reservado apenas aos melhores alunos ou àqueles que tenham conexões que lhes facilitem o acesso (o conhecido fator “cunha”).
Em última análise, esta medida, aprovada pela anterior maioria de esquerda, pode ter consequências adversas.
Em vez de democratizar a profissão, corre o risco de torná-la ainda mais elitista e inacessível para muitos jovens talentosos que não dispõem dos recursos necessários ou das conexões certas para iniciar a sua carreira na Advocacia.
Assim, é imperativo reavaliar estas políticas, procurando um equilíbrio que assegure a remuneração justa dos Advogados-Estagiários sem, contudo, inviabilizar o acesso dos jovens à profissão.
Porque não podem, como sucede noutras profissões, os Advogados-Estagiários receber bolsas do IEFP?
Somente através de um diálogo amplo e de uma compreensão profunda das realidades do setor será possível encontrar soluções que realmente democratizem o acesso à Advocacia em Portugal.
O conhecimento da realidade será sempre o primeiro passo para qualquer progresso significativo.
João Massano
Presidente do Conselho Regional de Lisboa