Marcos principais da evolução legislativa
Os direitos dos consumidores têm atualmente consagração constitucional no artigo 60.º da Constituição da República Portuguesa, com a proteção do “direito à qualidade dos bens e serviços consumidos, à formação e à informação, à protecção da saúde, da segurança e dos seus interesses económicos, bem como à reparação de danos” (n.º 1).
Mas nem sempre foi assim.
- A Constituição da República Portuguesa de 1976 fazia uma pequena referência aos direitos dos consumidores nas incumbências prioritárias do Estado [no artigo 81.º, alínea m)];
- Com a revisão constitucional de 1982, os interesses dos consumidores foram inseridos na Constituição Económica (artigo 110.º da CRP);
- E só com a revisão de 1989 é que adquiriam dignidade de direitos fundamentais (artigo 60.º da CRP);
- A revisão da Constituição de 1997 reconheceu, finalmente, a legitimidade processual das associações de consumidores para defesa dos seus associados ou de interesses coletivos ou difusos (n.º 3 do artigo 60.º da CRP).
A concretização destes direitos ocorreu por via da aprovação da primeira Lei de Defesa do Consumidor de 1981 (Lei n.º 29/81, de 22 de agosto), que veio a ser substituída pela Lei n.º 24/96, de 31 de julho, com sucessivas alterações, que está hoje em vigor.
O quadro legislativo português sofreu, posteriormente, diversos ajustamentos para a sua adaptação às regras europeias, com reforço dos direitos dos consumidores, na sequência da adesão à Comunidade Económica Europeia (CEE) em 1986.
A proteção e garantia dos direitos dos consumidores é, como sabemos, uma prioridade em todas as políticas da União Europeia (artigo 169.º do Tratado sobre o Funcionamento da UE) e muitas têm sido as medidas implementadas com esse intuito, priorizando:
- A segurança dos produtos;
- A segurança alimentar;
- A segurança dos produtos de cosmética e preocupações éticas;
- A proteção dos cidadãos em viagens / fim do roaming;
- A proteção nas compras on-line; ou
- A proibição de publicidade enganosa e práticas comerciais desleais.
Destacamos, nesse sentido, os cinco domínios prioritários da “Nova Agenda do Consumidor 2020-2025”:
- Transição ecológica;
- Transformação digital;
- Reparação e aplicação dos direitos dos consumidores;
- Necessidades específicas de determinados grupos de consumidores;
- Cooperação internacional.
De acordo com o Programa da Comissão para 2025 (“2025 Commission Work Programme” e anexos), que define as principais estratégias, planos de ação e iniciativas legislativas da Comissão Europeia para este ano, aguardamos, ainda, a publicação da “2030 Consumer Agenda” – que inclui “action plan for consumers in the Single Market” – prevista para o último trimestre de 2025.
Portugal tem adotado as medidas necessárias na transposição de atos da União Europeia para o direito nacional, como ocorreu com o Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de outubro, que regulou os direitos do consumidor na compra e venda de bens, conteúdos e serviços digitais, transpondo as Diretivas (UE) 2019/771 e (UE) 2019/770; ou com a Lei n.º 10/2023, de 3 de março, que completou a transposição da Diretiva (UE) 2019/2161, relativa à defesa dos consumidores.
Em termos de iniciativas legislativas, a Legislatura XVI – que agora termina com a dissolução da Assembleia da República – conheceu também novas iniciativas relacionadas com estas temáticas como:
- o Projeto de Resolução 768/XVI/1 (Prevê medidas de proteção do consumidor contra chamadas telefónicas e mensagens de texto fraudulentas);
- o Projeto de Lei 475/XVI/1 (Regime de proteção dos consumidores na alienação de créditos a terceiros);
- o Projeto de Lei 247/XVI/1 (Reforça as normas de proteção dos consumidores na utilização de aplicações de pagamento operadas por terceiros);
- o Projeto de Lei 61/XVI/1 (Revoga a possibilidade do financiamento da tarifa social da eletricidade poder vir a ser pago pelos consumidores); ou
- o Projeto de Lei 30/XVI/1 (Eliminação da obrigatoriedade do pagamento de folhas virtuais do livro de reclamações).
Os novos tempos impõe um incremento do nível de proteção e defesa dos consumidores, com respostas adequadas aos desafios hodiernos (como os decorrentes da era digital). Não esqueçamos que os Advogados assumem um papel central na defesa e cumprimento dos direitos dos consumidores. Tal ocorre não só nas vias judiciais, mas também aquando do recurso às entidades de resolução alternativa de litígios (na sua maioria, centros de arbitragem de conflitos de consumo). A sua presença é em muitos casos imprescindível principalmente devido à incontornável assimetria de formação, informação e conhecimentos entre consumidor e profissional também no quadro da relação jurídico-processual, com vários reflexos nas fases do processo, em especial na arbitragem.
FONTES |
Direitos e deveres dos consumidores: O que estabelece a legislação? Proteção e defesa dos consumidores | Eurocid – Informação europeia ao cidadão Casos Práticos de Direito do Consumo 25 Anos da Lei de Defesa do Consumidor Direitos do consumidor | DECO PROteste Os 30 anos da primeira lei de Defesa do Consumidor – Correio do Minho Que política para o Direito de Consumo Europeu no futuro? O novo foco na competitividade europeia |
NOTAS |
· No que diz respeito à proteção dos consumidores e com o início deste novo ciclo em termos de política europeia, são esperados desenvolvimentos em áreas fundamentais como o comércio eletrónico (cfr. a comunicação da Comissão Europeia “A comprehensive EU toolbox for safe and sustainable e-commerce”). · Para mais desenvolvimentos quanto à política para o Direito do Consumo Europeu no futuro, ver Que política para o Direito de Consumo Europeu no futuro? O novo foco na competitividade europeia. |